Sete pérolas para hollandri Imprimir

Marco Alexandre

da

Costa Rosário

 

POESIA

 

Editora Morangos & Uvas

(Seaculum Obscurum)

*BLITZBUCH*

1986

(SUMÁRIO – SETE PÉROLAS PARA HOLLANDRI)

POEMA PARA OS CRISTAIS

(frammento di un delirio)

POEMA PARA OS CRISTAIS

(SEGUNDA PARTE)

(vivagno di un sogno etrusco)

SOMBRAS

O RETRATO DE UMA MUSA ENVELHECIDA PELOS ANNOS

FACSIS ÊNDOLO PHISCODÁLICRO

CHANT DE HOLLANDRI

A QUEDA

A QUEDA

(Uma Continuação)

 

 

POEMA PARA OS CRISTAIS

 

(frammento di un delirio)

 

Eis aqui os filhos da prostituta bélica

rompendo as manhãs em grande festas

sobre as primeiras eras.

 

Tu,

 

nesta manhã sem glória,

procuras a

alegre musa das videiras

em chamas nunca reveladas.

Canções de antigas visões

vivendo a eternidade nas

quatro partes de um adágio

& todas as verdades vindas

da tua boca tornam-se mentiras

& todos os velhos deuses

mortos no passado

tentam hipnotizar

teus sentidos

vulneráveis.

Sabes o que um dia foi

verdade para um homem.

Vejo-te na frente de um espelho

acariciando os seios,

com as mãos marcadas pelo sangue

de um varão

acariciando os mais belos sonhos

de um sonho.

Deitas em tua cama

como frágil cristal quebrado

querendo os segredos descobrir

nunca tantas delícias vividas

nunca tantas dores sentidas

nunca tantos prazeres percebidos

SESSUALE STUNDE DI HOLLANDRI

 

 

POEMA PARA OS CRISTAIS

(SEGUNDA PARTE)

 

(vivagno di un sogno etrusco)

 

decapitazione

 

Estive morto por estes dias

andei e andei e andei e andei

e estou cansado de sepultar tantas vidas.

Deves te apiedar de mim,

eu, o matador de vidas

longe, longe, longe...

tão longe como o céu,

eu me recordo de antigos dias

à beira da estrada

quando olho para o selvagem oceano.

Talvez ela aguarde minha chegada...

longe, longe, longe...

tão longe como o céu.

Recordo suas feições

no espelho da memória...quão bela era... ela...osacri...

seus negros cabelos...serpentes negras em constante mutação...

Andei

por jardins outrora europeus,

vi a dama européia e suas concubinas argelinas

em seu quarto mantendo

antiga autoridade,

assediada pelos membros

da comunidade capifascistalista.

allimento dos cathólicos

por razões óbvias

elevado aos degraus máximos da insanidade dos vermes humanos.

Estúpidos latinos

Grandes suas illusões...eternos carrascos...

Violadores da própria morte in vi ta.

Talvez ella recorde minha face...

longe, longe, longe...

tão longe como o céu.

era triste sua palavra

era pálida sua tetrapétala

longe, longe, longe... eu a vi antes da decapitação

da Etrúria.

 

 

 

SOMBRAS

 

quantum putatus est

era esta a única saída

ullus incrementum

nas sombras da hora

 

era para mim inconcebível

tal ondulação

exordium virgo

perdido entre estas vagas

precipito minha existência

para o fundo de um abismo surreal

 

quantum putatus est

não era esta a última glória

mas o princípio dos infernos

eu bem tentei por esses dias

passar desfigurado entre os montes

laudauimus laudauimus laudauimus.

 

 

*Este poema foi publicado no jornal paraense A Província do Pará (2º Caderno, página 4), no dia 1º de junho de 1986 (Domingo), em Belém, Estado do Pará.

O RETRATO DE UMA MUSA ENVELHECIDA PELOS ANNOS

 

Entre as folhas do passado

eu vi seu rosto juvenil

 

esta                                         cadência                                              pelos

antiga                                 deformada                          annos

 

esta                                 agonizante                           as                      do

imagem                                       entre                                folhas                   jornal

 

ella               suporta              nova                                 nascida                       última

não                  a                centelha                          na                        década

 

agora           occulta         antigo                       entre           lágrimas           centauro.

Ella                  o               enthusiasmo            as                      do

 

Alli, ella espera o luxuriante desejo de se transformar em pedra.

 

FACSIS ÊNDOLO PHISCODÁLICRO

 

“Coisas há aí que                   Não quero ferir tuas alegrias com meu canto

passam                                                  nem atormentar o vôo dos pássaros.

sem                                             Não me forces a dar aquilo que

ser                                                 jamais poderia ser dado...por um homem.

criadas,                                               que queres que eu faça neste precioso momento?

E coisas criadas                                       Olha as ondas do oceano celestial,

há                                                      repassa os sentimentos pelos recantos da experiência,

sem                                         percebe as lendas naufragando na masmorra da

ser                                                                                                                         existência,

passadas...                              engole as palavras embarcadas na nau dos sentidos;

mas o melhor de tudo                                                                                      limite.

é crer em CRISTO...”                                                                           do

(Camões)                                                                                portais

Eu

os

atravessei

Nós atravessamos, nós atravessamos.

&

Nós pagamos altos preços, nós pagamos altos preços.

paguei

um

caro

preço

por

esta

ousadia.

Era preciso romper com a própria existência,

aliviar esta sentença

para encontrar a eterna existência,

ver os sonhos de Cristo entre as montanhas,

clarear os delírios, mantê-los acorrentados,

lapidar a essência.

A normalidade é para mim um vício detestável;

Rompeu-se a corda...

Quem ainda pode voar?

Levo minhas certezas para a margem da incerteza

máxima.

Rompeu-se a corda...

Quem ainda pode voar?

 

CHANT DE HOLLANDRI

Eu não queria te fazer chorar...

era apenas um sonho seiscentista do passado

quando não havia ainda

estas

f

á

b

r           olha profundamente para este

i                   jarro chinês:

c          tão clara como cristal

a          era outrora a sua forma.

s          Elle é agora

peça de museu como os homens da terra

Eternamente mudo em seu barulho

Silenciosamente estéril em sua agitação

Adormecido em seu próprio delírio

Execrado pelas senhoras das altas rodas

Exaltado pelos mortos.

quebre este jarro...quebre este jarro.

Agora é apenas dejeto de uma

f

á

b

r

i

c

a

 

A QUEDA

CAMINHO DE TORTURA

CAMINHO DE TORTURA

Assim o levamos, as mãos acorrentadas,

Sobre o silente céu vermelho.

TOCA O TAMBOR

TOCA O TAMBOR

O monte já é visível pela multidão:

perpetuação de resignação e perfeição.

Em ociosos passos as aparições

encontram seus espaços;

platéia de piedosos dementes, ansiosos por visões

de rebeldia,

a contemplar um deserto humano entre as cortinas

do firmamento.

TOCA O TAMBOR

TOCA O TAMBOR

Há repetição no canto,

este mesmo canto

vindo de um inquieto antro,

testemunho da glória e dos erros de eternos santos,

movendo a compaixão e a ira num simultâneo movimento

Os três condenados avançam...

aquele rosto vindo de um tempo remoto,

puramente humano

neste derradeiro momento.

Mãos e pés traspassados

pelo cravo,

embebedando o madeiro com suor e sangue.

Eis a procissão presenciando

a lenta multiplicação de cada pecado,

de cada virtude a mutilação.

Nos olhos do espectro

na cruz pregado, imagens são erguidas de todos os dias

de eras futuras.

 

A QUEDA (Uma Continuação)

 

Peste e fome, morte e guerra...

São ellas irmãs num mesmo segundo.

Deverão ellas, nos próximos dias,

ser a força da salvação;

quatro mulheres

pela lepra mundana marcadas,

descendo ao átrio,

semeando a vingança sobre a podridão humana.

TOCA O TAMBOR

TOCA O TAMBOR

A luz martiriza a respiração,

o corpo é elevado pela morte

a grandes alturas.

Ergue-se uma catedral eterna

em volta da magna cruz.

Estremece a terra,

vibrando os espelhos da desolação,

nas faces dos bufões.

Vagarosamente os mortos

voltam à cidade,

querendo ocultar esta

petrificada recordação.

TOCA O TAMBOR

TOCA O TAMBOR

Vão os fiéis companheiros

levar o corpo à sepultura celestial, à celestial sepultura,

e nós, redimidos da queda,

vamos, de queda em queda,

aos restos dos escombros,

silenciosamente aguardar a restauração.